Iniciativa
CNSeg - Confederação Nacional das Seguradoras

Acidentes do Trabalho no Brasil

 A história do seguro de acidentes do trabalho no país teve início há 102 anos com o Decreto nº 3.724, de 15 de janeiro de 1919, que regulou as obrigações resultantes dos acidentes no trabalho estabelecendo a responsabilidade objetiva do empregador. Até aquele momento a responsabilização do empregador só poderia ser efetuada através da comprovação de culpa, o que não era uma tarefa fácil naquela época. Este importante ponto de inflexão que marca a transição da responsabilidade subjetiva para a objetiva recebeu destaque na retrospectiva publicada pela Revista de Seguros, em janeiro de 1967:

Antes o empregador somente era responsabilizado pelas consequências dos acidentes de trabalho, se provada a sua culpa pela ocorrência de tais infortúnios. Com a nova doutrina sua responsabilidade passava a basear-se na teoria do risco, cumprindo-lhe sempre o encargo de promover reparação dos danos acontecidos (REVISTA DE SEGUROS, janeiro de 1967)

A entrada em vigor do Decreto nº 24.637, de 10 de julho de 1934, foi o ponto de partida para a transferência do risco de acidentes do trabalho para as companhias de seguros, e “(…) os lucros invejáveis demonstrados pelos balanços das seguradoras, na infância do Decreto nº 24.637, desataram a corrida de inúmeras companhias que até então se haviam mostrado indiferentes ao ramo de acidentes de trabalho”, afirmou a edição de fevereiro de 1943 da Revista de Seguros (REVISTA DE SEGUROS, fevereiro de 1943).

Apesar da ampla concorrência e o encarecimento dos serviços médicos, hospitalares e de medicamentos rapidamente reduzirem as margens de lucro das seguradoras, a carteira de acidentes de trabalho permaneceu um empreendimento muito atrativo por se comportar como um business catcher, fazendo da relação entre o mercado e os segurados de acidentes do trabalho uma ponte para a realização de seguros de outras modalidades.

O Decreto nº 24.637/1934 foi concebido em um contexto marcado pela crescente participação do Estado na economia brasileira, que estava inserido em uma tendência global que se seguiu à Grande Depressão de 1929. Essa conjuntura foi materializada na Constituição Federal de 16 de julho de 1934, que indicou a montagem de um aparelho burocrático-administrativo de intervenção, regulação e controle. Como parte desse amplo sistema voltado à supervisão e controle das atividades econômicas foi criado no Ministério do Trabalho, Industria e Comércio o Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização – DNSPC pelo Decreto nº 24.782, de 14 de julho de 1934, que também extinguiu a Inspetoria de Seguros.

O Brasil vivia os anos finais da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) quando o Decreto-Lei nº 7.036, de 10 de novembro de 1944, instituiu o monopólio do seguro de acidentes do trabalho em favor das instituições de previdência social, e estipulou o prazo de 31 de dezembro de 1953 para o encerramento das operações das companhias de seguros do setor privado no ramo de acidentes de trabalho. Além de prever a progressiva transferência do seguro de acidentes do trabalho para a competência do Estado, o decreto também vedava a concessão de novas autorizações para que outras seguradoras operassem no ramo. A partir da data da sua publicação somente as instituições de previdência social, as cooperativas de seguros de sindicatos, e as seguradoras que já forneciam o seguro de acidentes do trabalho poderiam continuar operando nesse segmento, pelo prazo máximo de 10 anos. Decorrido o período de transição, o monopólio estatal entraria em vigor. Contudo a Lei nº 1.985, de 19 de setembro de 1953, aprovada pelo Congresso Nacional adiou sine die a efetivação do monopólio.

Nem mesmo a exclusividade das instituições de previdência social instituída pelo Decreto-Lei nº 7.036/1944 abandonou a doutrina do risco profissional – “o empregador continuava o único responsável pelas reparações financeiras devidas em decorrência dos acidentes do trabalho”. Esta doutrina dava aos acidentes do trabalho “a característica essencial de um risco da área do seguro privado” (REVISTA DE SEGUROS, janeiro de 1967).

Esta tese foi ratificada por Luiz Mendonça em entrevista ao CPDOC FGV em 1996. Para o ilustre jornalista, que na data da entrevista celebrava uma trajetória de 57 anos no setor de seguros, o seguro de acidentes de trabalho foi integrado à previdência social com características indeléveis de um seguro privado. Para ele,

o seguro social implica cotas distintas, contribuições distintas. Implica a contribuição do empregado, do empregador e do Estado, porque o custeio de um seguro que possa proteger o empregado é baseado na sua falta de suficiência econômica. Então o empregador e o Estado contribuem sob o fundamento jurídico da paz social (…) no acidente de trabalho não, o fundamento jurídico é outro. É responsabilidade civil do empregador. Só ele paga o seguro, mais ninguém (LUIZ MENDONÇA, 1996)

  Segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde em 2020, o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking mundial de acidentes fatais ocorridos no ambiente de trabalho, e entre 2007 e 2017 registrou 1.324.752 (um milhão, trezentos e vinte e quatro mil, setecentos e cinquenta e dois) casos de doenças e acidentes relacionados ao trabalho, sendo: 703.193 acidentes de trabalho grave, 466.137 acidentes de trabalho por exposição a material biológico, e 50.841 intoxicações por exposição à substâncias químicas relacionadas ao trabalho. Casos de transtornos mentais (8.607), câncer ocupacional (1.233), pneumoconiose (3.810), dermatose ocupacional (6.554), perda auditiva induzida pelo ruído (6.645) e Lesão por Esforço Repetitivo – LER/Dort (77.732) também estão incluídos neste montante.

Para Marcio Coriolano, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras – CNseg, os números são muito expressivos e demonstram que “o governo não tem vocação para administrar sozinho os riscos que recaem sobre os trabalhadores”, e conclui: “reduziu-se muito a cultura da prevenção que existia na fase que o seguro de acidentes do trabalho não era monopólio do governo” (Rádio CNseg, 2018).

Ao longo da sua trajetória a CNseg tem desenvolvido importantes iniciativas voltadas ao retorno do seguro de acidentes do trabalho ao campo da iniciativa privada, entre as quais destacamos: a inclusão desta pauta na Carta de Brasília (1992), a primeira grande manifestação conjunta das empresas de seguro colocada publicamente como uma plataforma de demandas e de propostas concretas ao governo; no Plano Setorial de 1994, que foi apresentado com o fim de orientar e instrumentalizar as ações preconizadas como necessárias no Plano Diretor de 1992, e no estudo intitulado Fundamentos de uma proposta para a regulamentação do Seguro de Acidentes do Trabalho no Brasil, criado em 1999 e apresentado à Fiesp – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – e à Firjan – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro em fevereiro de 2000, tendo sido alvo de extensos elogios.

A quebra do monopólio do seguro de acidentes do trabalho visando à proteção do trabalhador também esteve presente na Carta do Rio (2001), documento conhecido por interpretar o pensamento, a vontade e o compromisso dos seguradores de adesão aos ideais democráticos do povo brasileiro, entregue ao então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, no aniversário de 50 anos da Fenaseg.

Tendo estado à frente da condução de importantes ações em prol da regulamentação do seguro de acidentes do trabalho, focadas na abertura desse mercado para a participação da iniciativa privada, o presidente da CNseg, Marcio Coriolano, afirma que “o setor segurador está pronto para atuar no seguro de acidentes do trabalho, desde que haja o fim do monopólio”, e que “já existem no mercado segurador várias modalidades de seguros que colaboram para reduzir o drama das vítimas de acidentes do trabalho, como o seguro de responsabilidade civil, com a cobertura para indenizar o trabalhador e os familiares, por acidentes do trabalho que provocam morte ou invalidez” (RÁDIO CNseg, 2018). Para conhecer o histórico de iniciativas da CNseg voltadas à privatização do seguro de acidentes do trabalho, acesse o portal do Centro de Documentação e Memória do Mercado Segurador: https://cedom.cnseg.org.br/

Revista de Seguros – fev 1943

 

Revista de Seguros – jul 1945

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